Boa noite, leitores!
Seguindo com as ideias que me vem à mente e que não tenho tempo para escrever, ou que um dia ainda irei escrever de certeza, ou que sirva de inspiração a alguém, aqui trago um rascunho de "Mãe Gentil".
"Mãe Gentil" é baseado na música de mesmo nome da banda República Popular.
Conta a história de João, típico brasileiro da classe baixa, morador de uma favela em Manaus que sonha em dar o melhor da sua vida pro seu filho. Entretanto, trabalhar decentemente é para poucos brasileiros.
Confira o texto a seguir! Valeria um livro?
"Só quero deixar claro que a minha realidade é o retrato da carência de carinho no país"
Créditos: http://www.generalbrasil.com.br/
Mãe Gentil
Por André Basualto
Prólogo de um João Ninguém: As coisas que tinha que decidir na vida
Meu nome é João, eu trabalho numa linha de
montagem do distrito industrial de Manaus. Tenho 35 anos e um filho de 14 anos
para sustentar. Minha esposa me abandonou quando fui despedido do meu emprego
anterior. Ela era muito bonita, mas preferiu arranjar alguém que tinha
dinheiro. Era quase quatro anos mais velha que eu e dizia que eu era muito
irresponsável e imaturo, mas a verdade é que eu tento ser trabalhador.
Sou brasileiro com orgulho, apesar de me
perguntar por que nasci nessa terra tão rica e ao mesmo tempo tão amaldiçoada
pela corrupção.
Aqui estou sentado na cadeira de madeira à
beira da mesa de ferro que eu emprestei do bar, daquelas de festinhas de
aniversário, com uma pata de madeira improvisada. Estou assistindo atentamente
à televisão enquanto como um pedaço de jambo. Sorte a minha ter conseguido um.
Os moleques daqui da rua sempre pegam tudo e é sempre quando terminam de brincar
de tacobol ou do jogo de futebol do fim da tarde.
Infelizmente reduziram meu salário mais uma vez
e acabam de anunciar o aumento dos impostos na televisão, que mais parece uma
caixa queimada e suja que se mistura ao chão de cimento e contrasta com os
tijolos laranjas expostos da parede de casa. Quanta safadeza tem nessa
televisão.
Amanhã vou falar com meu patrão para ver como
vai ficar minha situação. Quero pedir um aumento pra manter meu filho em uma
escola particular. É o que faço por alguém, vou me doar para o meu filho.
Apesar de ser pobre, e não ter completado o
ensino médio, adquiri o hábito de ler o que podia. Infelizmente quase não tenho
tempo para isso hoje. Por isso não estranhe se eu utilizar algumas palavras
mais cultas, ou mesmo se usar palavras que não adicionam nada a ninguém.
Eu só sei que nesse meu tempo de vida eu
aprendi uma coisa. Quem passa fim de semana na cachaça é quem mais tem
discussão na vida, apanha, bate na mulher e é infeliz. E quem estuda é quem tem
uma chance de conseguir algo na vida. Também tem outros jeitos de conseguir
ficar rico, mas nada supera o conhecimento, além de que a gente faz o possível
pra ensinar o filho a fazer as coisas certas.
Meu filho ainda vai ser um doutor. É o sonho
dele. E eu o apoio completamente. Chega de dores, elas vão ser curadas. E amanhã
vou pedir ajuda do chefe; esse meu apelo é informal, mas é sagrado.
Só quero mesmo é poder sair desse bairro, viver
de uma maneira mais decente e longe de toda essa violência. O contraste de um
país pode ser visto em cada cidade, onde a periferia é quase uma terra sem lei,
ou melhor, sob a lei de quem manda na boca.
Eu me levanto pra desligar a TV quando percebo
que alguém bate a porta.
- João, deixa eu entrar.
É a voz do César. O chefe da boca da favela. Eu
abro a porta. Se pudesse, nem me metia com eles.
- Fala, irmão. Fiquei sabendo que tu estás sem
grana. – Ele foi entrando com seu corpo magro, seu abadá, boné e um cigarro na
boca escondida pelo bigode ralo e a barba mal feita.
- É verdade.
- Toma. – Ele puxa uma arma de dentro do bolso
e estende-a para que eu a pegue. – Tu decides agora se vai comigo ou não pegar
um pacote agora à noite. Duvido que teu patrão te dê teu aumento. Aquele filho
da mãe tinha é que levar uma porrada. – Ele põe a arma na minha mão. Fico
nervoso. – Tu não tens escolha, irmão. E eu sei que tu ama teu filho. – Ele se
vira e vai embora.
O fato de ele ir embora só significava uma
coisa, aquela arma na minha mão ia ter que ir ao encontro dele de alguma forma.
Ou eu ia junto, ou alguém viria buscar. E eu tinha escolha?
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Mãe Gentil by André Basualto is licensed under a Creative Commons Attribution-ShareAlike 4.0 International License.
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E segunda, dia 24, estreia a série mais aguardada do blog: KOBAIAZ: EPISÓDIO ZERO - No Domínio do Medo. Confira a seguir alguns rascunhos de alguns protagonistas e antagonistas da série!
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